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ambiente

2 de março de 2020

Barcarena

Laudo confirma contaminação humana por
metais no entorno do polo industrial

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Os resultados foram entregues para a Secretaria Municipal de Saúde em novembro de 2018, mas até hoje os moradores não receberam seus laudos. Prefeitura foi intimada pela Justiça, mas até agora não cumpriu as determinações legais.

LILIAN PRIMI

A Prefeitura Municipal de Barcarena ainda não conseguiu contratar um médico toxicologista para acompanhar a entrega dos resultados de exames de cabelo e sangue da população de seis comunidades do entorno do complexo de mineração. Os laudos das amostras de sangue indicam índices acima do padrão de segurança para cinco metais com incidências que vão de 5,69% acima do limite considerado seguro (cádmio) a 98,37% (alumínio). A contaminação vem das águas que banham a região segundo denúncia dos moradores, referendada por laudos realizados por dois laboratórios, que recebem as águas servidas da Hydro Alunorte e também, os vazamentos que ocorrem nas bacias de rejeitos com as chuvas de verão todo ano. Além da Hydro, que produz bauxita, há denúncias contra a Imerys, que produz caulim.

A presença do médico toxicologista na entrega dos laudos foi determinada pelo juiz Raimundo Rodrigues Santana, da 5ª Vara da Fazenda Pública e Tutelas Coletivas, em três de fevereiro deste ano e inclui ainda a emissão de segunda via pelo Laboratório Central de Saúde Pública do Pará (Lacen), vinculado à Secretaria de Estado de Saúde Pública (Sespa), pois o primeiro estava rasurado e ilegível. A coleta foi feita no mês de julho de 2018, data da última denúncia de despejos de rejeitos de bauxita em rios e igarapés da região. O juiz deu 48 horas de prazo e estabeleceu multa diária de R$ 1 mil em caso de descumprimento. Segundo a enfermeira Brenda Pires Brandão, coordenadora do Departamento de Vigilância Epidemiológica da Prefeitura de Barcarena, foi adotada uma estratégia, a priori em conjunto com o Estado, para entrega com acompanhamento de um médico do trabalho, que teria experiência no tratamento de pacientes com teores alterados de metais no organismo. “Foi a alternativa que o Município teve, devido a dificuldade de contratar um médico toxicologista para laudar os exames. A gente nunca se ausentou de contratar um médico toxicologista. Desde que recebemos os exames (em 21 de novembro de 2018), entramos em processo de licitação. Publicamos os anúncios, no entanto tivemos dificuldades porque não existe no nosso Estado (profissional com essa qualificação)”, afirma. Brenda diz que no momento, está aberta uma licitação para contratação desse profissional fora do Estado. Foram realizadas 248 análises de presença dos metais alumínio, cádmio, chumbo, cromo e níquel em sangue e cabelo de pacientes que residem nas comunidades de Burajuba, Bom Futuro, Jardim Cabano, Conde, Itupanema e Vila Nova. Foram encontrados níveis acima do padrão para todos eles (veja tabela). As entregas começaram a ser feitas com supervisão dos médicos Cibele Maria de Almeida Guedes (CRM/PA 5047, pós-graduada em Medicina do Trabalho) e Edson de Jesus Oliveira Guimarães

40 anos de desastres 

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Barcarena recebeu desde os anos 1980, projetos de portos para exportação de alumina e alumínio, caulim, gado vivo e soja, indústrias de beneficiamento de bauxita e de caulim, infraestruturas como estradas, linhões e minerodutos, com presença de multinacionais como Vale, Hydro, Bunge, Imerys, Yara, Tocantins, Tecop, entre outros. Os problemas com a contaminação de riachos e igarapés que banham a região do pólo industrial começaram a ser denunciados em 2000. De acordo com o Ministério Público Estadual, a cidade registrou 17 acidentes ambientais graves no período de 2000 até 2016. Segundo o documento Barcarena Livre Informa 1: 37 anos de desastres socioambientais em Barcarenaos desastres socioambientais registrados no período de 2000 até 2016 em Barcarena/PA envolvem naufrágios, derramamento de lama vermelha, caulim, óleo, soja, contaminações da água, terra e ar entre tantos outros. Todos eles produzindo efeitos a médio e longo prazo, a maioria das vezes irreversíveis e definitivos na vida das pessoas, territórios e meio ambiente”. 

Guerra de laudos
O primeiro laudo, feito por determinação do Ministério Público Estadual (MPE) pelo Instituto Evandro Chagas e pago 
pela Imerys, que em 2007 deixou vazar mais de 200 mil metros

cúbicos de caulim da sua bacia de rejeitos em igarapés que levaram o veneno até o rio Pará, foi entregue mais de cinco anos depois e também foi rejeitado pela população por estar ilegível. As tabelas vieram com os cabeçalhos pretos e uma conclusão de que só “haviam coliformes fecais” nas águas atingidas e a população passou a chamá-lo de “relatório tarja preta”. 

O Ministério Público Federal (MPF) solicitou então outro laudo, dessa vez para o Laboratório de Química Analítica e Ambiental (Laquanam), da Universidade Federal do Pará, que confirmou altos índices de contaminação por metais. A partir de 2015, e sob os efeitos de um vazamento de lama vermelha das bacias de rejeitos da Hydro Alunorte, os pesquisadores do IEC passaram a confirmar a contaminação das águas. Os estudos técnicos das duas instituições indicavam, já em 2018, alta exposição do meio ambiente e das pessoas nos entornos do Complexo Industrial de Barcarena, onde a refinaria da Hydro está inserida. A Hydro também apresentou um parecer em sua defesa, feito pela empresa de consultoria SGW Services contratada por R$195 mil, que não detectou metais tóxicos nas águas da região. Os estudos foram comparados durante a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI), formada na Assembleia Legislativa do Estado (Alepa).

Em 2018, depois da entrega de laudos confirmando a contaminação das águas de Barcarena pelo Instituto Evandro Chagas, a Hydro entrou com uma ação civil pública contra o pesquisador responsável, Marcelo de Oliveira Lima, por calúnia e difamação. O MPF recomendou à Justiça que não aceitasse o pedido. Segundo o IEC, o "servidor agiu de acordo com suas atribuições". O IEC também se envolveu na análise das amostras de sangue, mas não divulgou os resultados no País. Há apenas um artigo publicado no International Journal of Environmental Research and Public Health, com sede na Suíça, assinado por sete pesquisadores do IEC e do Instituto de Saúde Coletiva da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), entre eles Marcelo Lima. O IEC pagou

R$ 7.981,24 pela publicação. (Clique para ver o documento de solicitação e o comprovante)

As tabelas publicadas aqui, com os resultados apresentados nos laudos, foram montadas pela enfermeira Brenda Pires Brandão, coordenadora do Departamento de Vigilância Epidemiológica da Prefeitura de Barcarena, a pedido da redação do Site do Congresso e expõe pela primeira vez a real situação dos moradores da região

Tabela 01: Análise em sangue

 

PARÂMETROS       LIMITE DETECÇÃO  PERCENTUAL

ALUMINIO (Al)                 2,065 µg/L            98,37%

CÁDMIO (Cd)                   0,297 µg/L              5,69%

CHUMBO (Pb)                  0,062 µg/dL          73,98%

CROMO (Cr)                     1,044 µg/L              67,88%

NIQUEL (Ni)                      0,371 µg/L                7,72%

 

 

Tabela 02: Análise em cabelo

 

PARÂMETROS      LIMITE DETECÇÃO    PERCENTUAL

ALUMINIO (Al)                0,581 µg/g                 99,59%

CÁDMIO (Cd)                  0,334 µg/g                36,58%

CHUMBO (Pb)                 0,558 µg/g               93,87%

CROMO (Cr)                    0,264 µg/g                71,83%

NIQUEL (Ni)                     0,208 µg/g               92,65%

Tabelas consolidadas pela Coordenadoria de Vigilância Sanitária da Prefeitura de Barcarena com base nos laudos com o resultado da análise de amostras de sangue e cabelo de 248 moradores de comunidades de Barcarena coletadas em 2018. O percentual indica o nível de contaminação para cada metal pesquisado. Por exemplo, no caso do alumínio, a quantidade encontrada nas amostras de sangue é 98,37% maior do que o limite

(CRM/PA 2792, especialização em Medicina do Trabalho pela Universidade do Estado do Pará) em novembro de 2018 e seguiram até janeiro do ano passado, quando a população questionou a capacidade dos médicos para avaliar as condições de saúde dos pacientes. Brenda conta que com isso, os médicos abandonaram o trabalho. “Para não interromper, porque a gente quer garantir todo o tempo que esses pacientes recebam os resultados, continuamos só com o assistente social, que acompanha os pacientes desde o segundo dia de entrega”, disse.

A prefeitura mantém a entrega, acompanhada pela assistente social no Hospital Municipal Maternidade Drº Afonso Rodrigues de Almeida Neves (HMARAN) de segunda a sexta-feira de 07:30 às 12:45h, por demanda espontânea. Até o momento foram entregues 84 laudos. 

Para entender melhor: 
Assista à palestra
e Marcelo Chalreo no nosso canal do
Youtube

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GUERRA DE LAUDOS

à esquerda, uma das tabelas do relatório "tarja preta"; à direita, resultados de estudo que mostra contaminação em toda a Foz do Amazonas e abaixo, a tabela do Laquanam, entregue em 2018, com os resultados de análise do cabelo dos moradores e que embasou o pedido de análise de sangue
pelo MPF

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