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Pandemia

20 de janeiro de 2022

Trabalhador vira protagonista neste início do terceiro ano de pandemia

  Com mais de 70% da população vacinada, a curva de mortes por COVID-19 neste início de ano se descolou da que registra o número de infecções – as duas já não sobem com a mesma velocidade, com a de mortes bem mais baixa e a de casos registrando recordes jamais previstos. Porém, em termos absolutos, a nova cepa poderá levar a novos recordes também de mortes, pelo número astronômico de infecções, que ontem passou de 200 mil em 24 horas. Que pode estar subestimada nas mesmas proporções, já que o sistema de notificações do SUS, hackeado em dezembro, continua instável. Começamos o terceiro ano da pandemia no mesmo caos e ainda mais perigosamente cegos do que no início, quando nada se sabia sobre o vírus.

  Em São Paulo, esse aumento foi de 30% na primeira semana deste mês e no Rio de Janeiro, afastou 20% do pessoal das unidades de saúde por infecção pelo corona ou H1N1. Mesmo com incidência muito menor de casos graves e mortes, começam a surgir notícias de aumento nas taxas de ocupação de leitos covid nos hospitais – Ceará e Goiás registraram ocupação de 87% dos leitos, seguidos por Pernambuco, com 86% e Espírito Santo, com 80%. Em Minas Gerais, ao menos um hospital está com 100% dos leitos de UTI para covid ocupados e no Ceará, 15% dos profissionais da saúde estão em casa, doentes com COVID ou gripe H1N1.

  O índice geral de ocupação de leitos no Estado de São Paulo é de 54%, mesmo depois do aumento dos 98 disponíveis em primeiro de janeiro para 474 agora. Neste mesmo período, apenas na rede da cidade de São Paulo, o número de profissionais afastados por Covid-19 ou síndrome gripal nas unidades de saúde subiu de 1.585 (em seis de janeiro) para 3.193 trabalhadores uma semana depois (13 de janeiro) segundo a secretaria municipal. A situação mais grave ocorre na rede de atenção primária e a prefeitura anunciou novas contratações e o pagamento de horas extras que estavam no banco de horas, segundo o Sindicato dos Médicos do Estado de São Paulo (Simesp), graças à pressão da categoria, que ameaçou entrar em greve e se manteve mobilizada, reunida no Viaduto do Chá, em frente à Prefeitura, mesmo depois de ter a greve proibida pela Justiça.  O presidente do sindicato, Victor Dourado, em um comunicado oficial publicado no dia 17 de janeiro, acusa o secretário de Saúde, Edson Aparecido dos Santos, de esconder as reais condições de atendimento nas unidades de saúde da cidade, em especial na atenção básica. “Não foi apresentado nenhum plano de contingência ou de reposição dos profissionais afastados. O que a gente observa é a truculência da gestão na reunião com os médicos, a falta de medidas efetivas e querem mais uma vez que a gente se contente simplesmente

Com a ômicron, a pandemia se espalha em progressão geométrica e ameaça colapsar os sistemas de saúde e também os de limpeza, transportes e o comércio. Desta vez por conta de afastamentos massivos de trabalhadores infectados somados a falta de competências das autoridades para lidar com a situação

Infectados

(nas últimas 24 horas)

204.854

dia 19/01, quarta-feira

 

Taxa de transmissão

(TR)

1,3%

Fonte: Imperial College de Londres

dia 18/01, terça-feira

LILIAN PRIMI

Médica Maria Maeno fala sobre explosão da ômicron
juntamente com a gripe, dos riscos da redução do tempo de isolamento e o que fazer para se proteger

  Para agilizar o atendimento do trabalhador com suspeita de infecção por COVID-19 ou H1N1, a Secretaria Municipal de Saúde de Campinas, através do Centro de Referência em Saúde do Trabalhador (Cerest-Campinas) implantou um serviço de atendimento online para os que precisam de atestado sanitário, documento criado há dois anos pela secretaria de saúde da cidade para formalizar o afastamento de profissionais com suspeita de ou teste positivo para covid.

  A virtualização do serviço, com automatização da emissão do atestado sanitário, foi feita agora em janeiro, depois de um aumento significativo da demanda pelo documento e tem o objetivo de desafogar as unidades de atenção básica da cidade. “Só nós, do Cerest, estamos emitindo esse atestado. Na quarta-feira (12-01) tínhamos uma fila de 40 pedidos. No final do dia na sexta-feira (14-01) a fila atingia 1,2 mil”, disse o médico Marcos Sabino, do Cerest-Campinas. A expectativa é de que a demanda cresça ainda mais. “O pessoal da Vigilância está super ocupado e os postinhos (de atenção básica) estão fazendo gripário. E tem a dengue...”, argumenta.

  O documento pode ser solicitado por meio de auto declaração preenchida online ou pelo serviço 160 e está aberto apenas para as pessoas com teste positivo ou sintomas gripais ou contatantes que trabalhem ou morem na cidade. São suspeitos casos que apresentam dois ou mais sintomas de síndrome gripal (febre/sensação de febre, coriza/nariz escorrendo, tosse seca, congestão nasal/nariz entupido, dor de garganta, tosse com catarro, dor no corpo, perda de olfato, perda de paladar).

  Para obter o atestado, a pessoa deve acessar o link do serviço e seguir preenchendo todas as telas. O atestado é emitido no final, automaticamente e sem necessidade de avaliação técnica, mas passível de auditoria. A responsabilidade civil, criminal e trabalhista é do cidadão. "Por conta da limitação da capacidade de intermediação pelos técnicos do Devisa/Cerest, e pela premência de interromper, cortar as cadeias de transmissão, o sistema passou a ser automático. Declaratório, pelo cidadão.", explica o médico. Quem precisa de orientação, deve ligar para o 160. Profissionais de saúde (pública ou privada) ou que trabalham na segurança pública também devem procurar serviço médico.

com promessas e passagem de responsabilidade para as OSS, ao invés de medidas efetivas”, afirma Victor.

  Além da mobilização do Simesp, que pede principalmente a recomposição completa das equipes por meio de novas contratações; enfermeiros também reagem ao excesso de demanda e se dizem no limite da exaustão. Um levantamento do Conselho Regional de Enfermagem de São Paulo (Coren-SP) mostra que, entre os entrevistados, quase 82% estão atendendo mais pacientes; 41% sofreram agressões verbais; e 33% cumprem uma jornada de trabalho maior.

COLAPSO ATINGE OUTRAS CATEGORIAS

Há cinco dias houve uma onda de matérias publicadas de forma pontual pelos jornais, com muitos registros de colapso nos atendimentos de saúde por falta de profissionais, mas também de lojas que tiveram de fechar por conta de surtos entre os funcionários, cancelamentos de vôos pelas companhias aéreas por falta de tripulação e problemas de operação em linhas de ônibus urbanos em diferentes Estados do País (veja em Últimas Notícias).Estas parecem ser as categorias mais afetadas, além da saúde, mas há registros importantes e generalizados pelo país também entre bancários e pessoal da limpeza urbana. Pontualmente, os químicos da região de Jundiaí reclamam que trabalham demais por conta dos afastamentos por covid e gripe; a Rede Globo de Televisão adiou a estreia de um remake da novela Pantanal por causa de um surto entre os funcionários; e o INSS suspendeu as perícias “pente fino”, do Programa de Revisão de Benefícios por Incapacidade. O problema tem se agravado porque as contaminações aceleradas da ômicron se somam a surtos de gripe, que surgiram de forma inesperada em pleno verão, criando ainda mais dificuldades aos trabalhadores que adoecem.

  E também porque a falta de informações a respeito dos impactos da covid no mundo do trabalho continua, apesar do protagonismo atual. Não há uma informação compilada sobre o impacto dos afastamentos nas diferentes categorias, mas a reação dos sindicatos e representações das mais afetadas são um indício bastante forte de que a situação é caótica, com tendências de piora a cada dia.A Federação Nacional dos Petroleiros (FNP), por exemplo, afirma que a empresa não está afastando funcionários com teste positivo para COVID. No setor bancário, com cerca de 620 agências fechadas e mais de 1.500 trabalhadores confirmados com Covid-19 apenas na base do Sindicato de São Paulo, Osasco e Região, o Comando Nacional  reuniu-se na terça-feira (dia 18-01) com a Federação Nacional dos Bancos (Fenaban) para discutir a

AFASTAMENTOS-ATESTADO.jpg

Secretaria de Saúde de Campinas emite
atestado sanitário online

FOTO: DIVULGAÇÃO Sindicato dos Bancários de SP

adoção de medidas preventivas como a retomada do home office; suspensão de visitas a clientes; melhorias do atendimento em telemedicina; compromisso com a não-demissão; e volta do controle das entradas em agências bancárias. Há registros também de mobilização dos funcionários da Limpurb, a empresa de limpeza urbana do Rio de Janeiro, dos motoristas de ônibus da cidade de São Paulo e dos químicos de Jundiaí.

RESPOSTA “MEIA BOCA”

A resposta do Ministério da Saúde para a situação caótica nos ambientes de trabalho, de reduzir para 5 dias o período de afastamento de infectados e seus contactantes, veio com atraso e a reboque de uma atualização questionável dos protocolos de afastamento feita pelo Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC, na sigla em inglês), a agência reguladora de saúde estadunidense, no dia 27 de dezembro do ano passado. “O próprio presidente da CDC admite que é preciso ter cautela com a ômicron, mas mesmo assim a decisão de reduzir o tempo de afastamento foi tomada. Eles cederam às pressões do mercado”, diz a médica Maria Maeno, especialista em medicina do trabalho e coordenadora da pesquisa Dossiê Covid no Trabalho.O argumento do CDC é que as atualizações refletem “a ciência atual sobre quando e por quanto tempo uma pessoa é infecciosa ao máximo”, e faz a ressalva de que elas não substituem as leis, regras e regulamentos estaduais, locais, tribais ou

afastamentos redes-fenaban-covid.jpg

BANCÁRIOS - Reunião virtual entre o comando nacional e os representantes da Fenaban

territoriais; nem se aplicam aos profissionais de saúde. A médica Eclea Bravo, no entanto, do Grupo de Saúde do Trabalho do Instituto Walter Leser, ligado à Faculdade de Sociologia e Política de São Paulo, conta que o estudo utilizado como “base científica” destas atualizações pelo CDC acompanhou apenas seis pacientes. “Isso mesmo, seis. Meia dúzia. Uma absoluta falta de bom senso, porque a presença do vírus nos ambientes de trabalho, apesar das máscaras, vai promover ainda mais afastamentos”, afirma. A decisão do MS promoveu uma multiplicação dos tipos de protocolos de afastamentos, gerando dúvidas entre trabalhadores e muita reclamação das representações sindicais e

de classe.  O Conselho Federal de Enfermagem (Cofen) já tinha apontado a sua preocupação com esta redução antes mesmo da decisão do Ministério, em virtude do pedido neste sentido feito pela Associação Nacional de Hospitais Privados (Anahp) ao ministro. O objetivo era justamente evitar a paralisação completa de unidades, uma questão logística. “A enfermagem está desgastada, estamos há dois anos trabalhando em sobrecarga. E sabemos que o profissional de enfermagem é uma das profissões essenciais, e precisam estar bem para conseguir fazer o atendimento da população”, alertou conselheiro Daniel Menezes.

  As contaminações seguem aceleradas em todo o país.

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