INSTITUTO
WALTER LESER
Saúde coletiva & cidadania
Pandemia
01 de julho de 2020
CoopCycle: o Davi da economia do bico
COMO FUNCIONA
O conjunto de serviços é financiado por cotização, o que é definido pelos integrantes da CoopCycle como uma “contribuição contra o efeito rentista capitalista”. A taxa e os fundos arrecadados são administrados democraticamente por todos os membros, dando a eles controle tanto da atividade em si, quanto da ferramenta de trabalho. Os membros da federação decidem o valor da contribuição de cada um de
acordo com o seu status (cooperativa, associação ou instituição), a alocação de fundos e o regime de remuneração para prestar o serviço. Esses critérios devem ser seguidos também no nível local, nas cooperativas que a integram.
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Reclaiming Work: The Cycle Couriers Subverting The Gig Economy
Breve documentário sobre as cooperativas de ciclistas, de Cassie Quarless e Usayd Younis, produzido pela Black & Brown Film, uma produtora sediada em Londres, voltada para filmes com foco nas pessoas negras e no público de massa. O primeiro documentário da dupla, Generation Revolution, foi lançado nos cinemas do Reino Unido em novembro de 2016. Atualmente, desenvolvem projetos com a BBC e um documentário financiado pela IFP e HBO .
Eles se cotizaram e financiaram o desenvolvimento de um aplicativo de entrega com base no lema de segurança social francês e passaram a concorrer com os gigantes Deliveroo e Uber. Deu certo.
LILIAN PRIMI
Começa a crescer na Europa, o número de cooperativas de ciclistas que usam uma versão socialista de aplicativo de entrega. Desenvolvido pela CoopCycle, uma federação de cooperativas criada na França para “mutualizar dinheiro, colocar em comum, para compartilhar serviços como o nosso software”, segundo Mathis Lorenzo, membro da federação, o app segue critérios que garantem trabalho digno e seguro para a categoria, além do controle sobre como a atividade é organizada. O conjunto de serviços oferecido pela federação, formado por software, aplicativos para smartphones, mapeamento, seguros e construção de alianças com potenciais fornecedores, está permitindo que esse pequeno Davi comece a acreditar que pode vencer gigantes como Deliveroo e Uber, que monopolizam o mercado de delivery no mundo todo.
As plataformas para cooperativa surgiram no rastro de um movimento de democratização digital iniciado em 2016 no Reino Unido pelo Partido Trabalhista, com o Manifesto de Democracia Digital. O CoopCycle foi desenhado na França, nas plataformas de código aberto, sob o lema da segurança social francesa: "A cada um segundo seus meios, a cada um segundo suas necessidades" - e a partir da experiência dos ciclistas que trabalhavam para os aplicativos capitalistas, mas não está disponível para qualquer um. “O acesso ao app da CoopCycle é reservado à cooperativas pertencentes a trabalhadores de entrega e nas quais os ganhos são democraticamente compartilhados entre todos”, explica Mathis.
Hoje o CoopCycle está presente no Reino Unido, França, Alemanha, Espanha, Canadá e Polônia em pequenas cooperativas de ciclistas - 80% tem entre três e cinco trabalhadores apenas, a maior parte ex-Deliveroo e Ubers -, que atendem o público local, mas elas se multiplicam rapidamente e já são encaradas como uma alternativa viável para a classe trabalhadora. “Se não contarmos os coletivos que estão entrando em contato conosco mas não estão estruturados, são em torno de 25. Acho que temos cerca de 120 a 150 membros”, estima Mathis.
A maioria foi criada por entregadores “desligados” dos grandes aplicativos e se diferenciam basicamente pela forma de cálculo do serviço: os entregadores ganham por hora trabalhada e os restaurantes pagam uma taxa menor: enquanto a taxa média dos aplicativos globais está entre 30% e 50%, o La Pájara, por exemplo, de Madri, cobra 25%. Comerciantes entrevistados pela mídia local ressaltam ainda que, além de cobrarem menos, a qualidade do serviço é bem maior, porque “os entregadores são bem humorados e trabalham mais tranquilos”.
O propósito do CoopCycle é político, funciona como uma arma de defesa e também de ataque na luta de classes. “Com certeza, achamos que é uma alternativa: os trabalhadores conhecem seu trabalho, eles só precisam possuir sua ferramenta, ou seja, principalmente o software”, explica Mathis, que com a pandemia, está vendo o interesse pelo app crescer no mundo todo. “Sim, pode se espalhar, mesmo que no momento seja mais difícil ajudarmos os trabalhadores locais, por exemplo na América do Sul, em seu projeto, porque não temos conhecimento do contexto local (status administrativo, condições de trabalho, etc.). Mas estamos trabalhando nisso”, promete.