
INSTITUTO
WALTER LESER
Saúde coletiva & cidadania
Diante da iminente votação da PEC 10/2020 pelo Congresso Nacional, publicamos uma resumidíssima coletânea de dados que relacionam diretamente o processo de financeirização mundial, marcado principalmente pela produção desenfreada de títulos privados, ativos financeiros tóxicos, e seus inúmeros e diversificados papéis financeiros e produtos derivados de invenções criativas que promovem empacotamentos e emissões subsequentes de forma ilimitada.
A produção desenfreada de títulos privados tóxicos causou a crise financeira iniciada em 2007 nos EUA e logo atingiu a Europa, provocando o comprometimento de trilhões de dólares e euros para o “socorro” aos grandes bancos, mas a produção de derivativos não cessou!
Esse funcionamento altamente temerário do mercado financeiro tem levado à criação de “Bad Banks”, uma espécie de armário para os quais são transferidos os papéis podres que passam a pesar demais no passivo dos bancos. Os papéis podres ficarão aí até que possam ser transferidos desses armários para alguma unidade gestora (algum banco central…) ou fundo (em geral fundo de pensão de trabalhadores), como mostra recente notícia 1 sobre a criação de Bad Bank na Alemanha, que recebeu 74 bilhões de euros de ativos tóxicos do Deutsche Bank.
Esse levantamento publicado em novembro/2019 revelou que a “carteira podre” dos bancos chegava ao valor de quase R$ 1 Trilhão, sem considerar a correção monetária! Se computada essa correção, chegaremos a vários trilhões, pois esses ativos privados vêm sendo acumulados nos bancos há 15 anos, segundo o levantamento!
O valor coincide com o valor de R$972,9 bilhões, portanto, quase R$ 1 Trilhão, informado pelo presidente do Banco Central aos senadores em 09/04/2020, quando indicou o valor dos ativos privados que a PEC 10/2020 autoriza o Banco Central comprar de bancos, demonstra que ele já tinha conhecimento preciso (com vírgula!) do conteúdo do pacote de créditos privados a serem comprados pelo Banco Central.
É urgente que os parlamentares que estão votando a PEC 10/2020 saibam o que estão autorizando, pois, conforme Notificação Extrajudicial enviada pela Auditoria Cidadã da Dívida a todos os deputados(as) federais, o voto de cada um representa a corresponsabilidade sobre o imenso dano que a compra desses papéis podres significará: o Banco Central pagará por tais papéis podres com títulos da dívida pública emitidos pelo Tesouro Nacional, e terá que imediatamente passar a pagar juros sobre essa dívida. É por isso que a PEC 10/2020 já inclui em seu texto também a autorização para emissão de novos títulos públicos para pagar juros!
Essa breve linha do tempo mostra o imenso dano que a PEC 10/2020 representa para as finanças públicas e para toda a sociedade brasileira, razão pela qual deve ser rejeitada pelo Congresso Nacional.
Se a PEC 10 for aprovada, os bancos irão vender esses créditos diretamente para o Banco Central pelo preço que quiserem! E receberão, em troca, títulos da dívida pública brasileira e seus generosos juros!
Será que os parlamentares que estão votando essa PEC 10 têm noção do tamanho do dano ao erário que estão autorizando? Antes de autorizarem tal operação, parlamentares teriam que solicitar ao Banco Central a completa discriminação dos beneficiários, o detalhamento dos riscos envolvidos e demais informações sobre cada um dos créditos privados englobados no valor de R$972,9 bilhões (mais informações aqui) informado pelo presidente do BC aos senadores em 09/04/2020, sob pena de assumirem a corresponsabilidade sobre tal operação às cegas.
A nova versão do texto aprovado no Senado incluiu pequenas modificações superficiais que não alteraram em absolutamente nada a essência da bizarra autorização para o Banco Central comprar derivativos e debêntures no mercado de balcão, sem limite de valor, sem divulgar o beneficiário do dinheiro público, etc. e pagar com dinheiro público, provocando o crescimento exponencial da dívida pública representada pelos títulos emitidos pelo Tesouro Nacional, e terá que imediatamente passar a pagar juros sobre essa dívida. É por isso que a PEC 10/2020 já inclui também em seu texto a autorização para emissão de novos títulos públicos para pagar juros!
Essa breve linha do tempo mostra o imenso dano que a PEC 10/2020 representa para as finanças públicas e para toda a sociedade brasileira, razão pela qual deve ser rejeitada pelo Congresso Nacional.
========================================NOTAS & REFERÊNCIAS=======================================
(iii)WATERFIELD, B (2009) European bank bail-out could push EU into crisis. The Telegraph [online] 11th February Available from: http://www.telegraph.co.uk/finance/financialcrisis/4590512/European-banks-may-need-16.3-trillion-bail-out-EC-dcoument-warns.html [Accessed: 4th June 2015]
(iv)Asset relief schemes include:
-
asset removal schemes, which witch aim at removing impaired assets from bank’s balance sheet either via direct government purchases or by transferring them to independent asset management companies (which are sometimes referred to as “bad banks”);
-
asset insurance schemes, which keep the assets on the banks’ balance sheets but insure them against tail risk. Source: Van Riet (2010).
(v) https://www.ivixvaluecreation.com/clipping
(vii) Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais – Parecer de Orientação 11/2008
(viii)Segundo especialistas do mercado financeiro, os papéis financeiros podem ser renovados no sistema em minutos. Dessa forma, papéis acumulados a 15 anos na “carteira podre” dos bancos poderiam ser facilmente renovados para uma data recente nos sistemas internos dos bancos.
(ix) As contrapartidas (relacionadas à manutenção de empregos) inseridas no Art. 4o do texto da PEC 10 votado em segundo turno no Senado não alcança os beneficiários das compras de créditos privados pelo Banco Central, tendo em vista que:
– os beneficiários dessas operações feitas pelo BC não serão identificados, o que impede verificar o cumprimento de qualquer contrapartida;
– segundo o próprio relator Anastasia “a natureza do mercado secundário e as características dos títulos a serem adquiridos impedem que se imponha restrições relativas à dispensa de pessoal ou às bonificações de diretores de empresas, pois a empresa não-financeira emissora do título não é a beneficiária da aquisição no mercado secundário, que tem caráter fluido. Em verdade, o grande objetivo desta medida é dar liquidez ao mercado secundário, gerando confiança em seu regular funcionamento, sem beneficiar individualmente qualquer empresa, mas sim todo o sistema de crédito. Daí a impossibilidade de acolher as emendas que se referem a estas limitações, não por seu justo mérito, mas por impossibilidade fática.”
Assim, somente bancos e grandes corporações ligadas a eles serão beneficiadas, como constou do próprio relatório de Anastasia, analisado nas Notas Técnicas ACD 3 https://bit.ly/3ctnyqu e 4 https://bit.ly/2xBYYoM .
(x) https://epocanegocios.globo.com/Economia/noticia/2019/11/epoca-negocios-retomada-da-economia-pode-destravar-carteira-de-r-1-tri-em-creditos-podres.html também disponível em https://auditoriacidada.org.br/grandes-jornais-revelaram-a-existencia-de-r1-tri-em-papeis-podres-nos-bancos/
(xi) https://www.moneytimes.com.br/ativos-privados-que-bc-pode-comprar-caso-pec-seja-aprovada-somam-r-9729-bilhoes/ também disponível em: